quarta-feira, julho 31, 2002

 

(( Cientista quer domesticar buracos negros ))

SALVADOR NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo

Na porta de uma das salas em certo instituto de física, lê-se a placa: "Cuidado, buraco negro ativo no laboratório. Acesso restrito a pessoal autorizado." Esse lugar ainda não existe, mas, segundo o físico Mário Novello, alguma coisa desse tipo já está ao alcance dos cientistas -ele defende a criação de um buraco negro doméstico.

O próprio Novello não pretende se dedicar à empreitada (ele é um físico teórico, não experimental), mas está oferecendo aos que se interessarem pela idéia todos os detalhes do que precisaria ser criado em laboratório para a produção do objeto. Ele está apresentando tudo que sabe sobre a criação de buracos negros artificiais durante a 10ª Escola Brasileira de Cosmologia e Gravitação.

O evento, que já tem 25 anos e reúne pesquisadores e estudantes de pós-graduação do mundo todo, começou ontem em Mangaratiba (RJ) e termina no dia 9. Ele é organizado pelo CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas), um dos institutos federais que deveria extinguir seus programas de ensino acadêmico por recomendação da Comissão Tundisi, criada por iniciativa do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Felizmente, o buraco negro de Novello não seria tão voraz quanto os que devem existir no espaço. Essas versões naturais do fenômeno são criadas quando uma estrela implode, compactando-se. Sua gravidade fica tão intensa que nada em suas redondezas pode escapar dela, nem mesmo as partículas da luz (os fótons).

Como não seria saudável (nem seguro, ou mesmo possível) juntar tanta massa em um laboratório, a solução para o problema foi conceber um modo de criar um buraco negro não-gravitacional.

Análogo comportado
A idéia de Novello parte justamente desse princípio. Ele diz que é possível criar o mesmo efeito de um buraco negro em um material capaz de conduzir eletricidade, submetido a um campo elétrico devidamente ajustado. Só que essa versão domesticada do objeto seria capaz de aprisionar apenas a luz. Pedaços de matéria poderiam passar por ele sem ser sugados. Um alívio para os cientistas envolvidos no projeto, sem dúvida.

A quantidade de energia envolvida na criação de um buraco negro gravitacional é proibitiva para ser manipulada em laboratório, mas esse análogo eletromagnético seria bem menos custoso.

"Ouvi falar que nos EUA já há um grupo fazendo algo experimental nos moldes do que proponho", conta Novello. E ele vê várias vantagens em seu buraco negro doméstico, comparado ao natural. "Nunca poderemos manipular um buraco negro gravitacional. Já o meu é controlável, porque a força eletromagnética é polarizada, tem cargas negativas e positivas, de modo que você pode administrar o fenômeno."

Caso seja criado, o buraco negro doméstico poderia comprovar uma idéia do físico Stephen Hawking. O britânico previu que buracos negros na verdade não são totalmente "negros", mas emitem radiação e acabam evaporando ao longo dos éons. Segundo Novello, essa radiação, caso exista, seria observável em um buraco negro eletromagnético. "Seria a primeira evidência experimental da radiação Hawking", afirma.

Uma outra aplicação que Novello antevê para seu buraco negro seria de potencial interesse militar -a tecnologia definitiva de invisibilidade. "Num buraco negro eletromagnético, os fótons são aprisionados num dado lugar do espaço-tempo", diz. "No limite fantástico, você poderia envolver um objeto nessa estrutura, tornando-o totalmente invisível."

Comments: Postar um comentário

<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?