((Celacanto ))

(( Para onde vai o mundo com os vasos sanitários on-line? ))

FRANCISCO MADUREIRA
Editor de Informática da Folha Online

Retiro espiritual. O dito trono é, para muitos, o momento de reflexão, de paz, de alívio. Situação em que você pode esquecer do mundo e pensar em você.

Mas o banheiro também um lugar de cultura e aprimoramento pessoal. Há quem goste de ler no banheiro. Outros levam violão, e também há os que levam o notebook para trabalhar, jogar ou ver mulher pelada, sei lá.

Mas agora vem a Panasonic e monta uma exposição no Japão para mostrar um vaso sanitário com internet.

O negócio ajusta-se automaticamente ao volume de seu traseiro e analisa sua urina. Caso detecte alguma anormalidade na composição, automaticamente envia um e-mail para seu médico.

Quando chegar ao mercado, em 2005, certamente não será parte do banheiro da maioria da população —ainda mais no Brasil. Mas, como não é bom cuspir para cima e em longo prazo a coisa pode pegar, gostaria de convidar o leitor a um passeio por algumas situações do cotidiano de alguém que tem uma "privada on-line".


O sujeito chega em casa apertado e corre para o banheiro. Desabotoa o cinto, abaixa suas vestes, mas percebe que seu vaso sanitário foi invadido por hackers. O assento simplesmente não se encaixa no seu traseiro, ou fica largo demais, ou então muito justo.


Durante uma sessão de leitura no banheiro —para momentos mais longos, se é que o leitor entende—, ocorre um erro fatal, e o vaso sanitário trava, o assento é recolhido e intala o sujeito na privada.


O marido ciumento altera as configurações do vaso sanitário para que os e-mails com análise de urina da mulher sejam direcionados para ele, em vez do médico. Quatro meses depois, mesmo com as fortes enxaquecas que a mulher sofre de sexta à noite, descobre que ela está grávida.


Hackers invadem o vaso sanitário da casa do sujeito e "plantam" um cavalo de Tróia, pequeno arquivo que registra tudo o que acontece na privada, quantas vezes o sujeito usa o banheiro por dia etc.


As empresas de marketing virtual criam um "cookie sanitário", pequeno arquivo instalado em seu vaso sanitário que analisa seus dejetos e serve de "feedback" —com esses dados, elas podem saber que tipo de alimentação as pessoas têm, quais são os problemas de saúde mais comuns etc. A partir daí, elas podem bolar estratégias de publicidade.


Surgem os vírus para privadas on-line. Eles expõem na rede mundial de computadores tudo aquilo que você faz no vaso sanitário.

Esses são alguns poucos delírios sobre um vaso sanitário on-line. Quero aproveitar e, no espírito da coluna Usuário.com, pedir aos leitores que dividam comigo outras idéias absurdas que apareçam na cabeça.


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Longe da brincadeira, pensar num objeto tão íntimo de uma casa conectado à internet remete, imediatamente, ao livro "1984", de George Orwell. Aliás, parece que este autor nunca esteve tão em voga quanto atualmente.

Uma invenção como essa aponta para um futuro absolutamente diferente para a vida das pessoas.

De um lado, você vai perder completamente sua privacidade. Tudo o que você fizer poderá ser observado, cadastrado, listado. Toda a informação que você emitir —seja escrita, oral e até fecal— será registrada. E tudo o que está registrado pode ser acessado. Os hackers estão aí para isso, e não há barreira de segurança no mundo capaz de impedir o acesso à informação.

Por outro, exatamente pela consciência da observação, os comportamentos terão de ser mais regrados —ou mais teatrais, hipócritas e fingidos. Cria-se uma nova dimensão de consciência psíquica, afinal, o inconsciente coletivo ganha um par de olhos e outro de ouvidos. Ele analisa diretamente tudo o que você faz. As pessoas viram paparazzi de si mesmas. O "reality show" já antecipa isso.

Se a privada com internet chega ao mercado em 2005, eu e você teremos a chance de ver, em vida, invenções que levarão o acesso à informação para muito além disso. Se é bom ou ruim? Esperar para ver —e ser visto.